terça-feira, 10 de junho de 2014

Aliança

E então o filho nasceu gay. Desde pequeno exibe trejeitos menos masculinos, dança, canta, adora interpretar e tem os sentimentos à flor da pele. Desde pequeno, lembra-se de observar atentamente os corpos masculinos nos vestiários dos clubes de natação que freqüentava, sem sentido sexual, por causa da tenra idade, mas com uma adoração daqueles corpos já formados. Músculos e pelos. A forma masculina em sua essência. 

Chegou a adolescência e, com ela, os desejos. Observar já não era mais suficiente. Mas todo o peso da sociedade, da moral e dos bons costumes resolveram cair sobre seus ombros. Em 1989 deu seu primeiro beijo, com uma menina que seria a consorte da Rainha do Axé, em 2013. Seguiu-se a grande paixão platônica da adolescência, Daniela. Depois, a primeira namorada fora dos muros do colégio,  Ana Paula. E assim vieram Marianne, Daniela, Flavia, Cristina e, enfim, Manuela, com quem passou belos anos e teve, pela primeira vez, seu coração inteiramente destruído. 

Nesses anos todos, quis realmente estar com todas elas, mas jamais deixou de observar a forma masculina. Modelos de sunga em outdoors captavam seus olhares. Capas de revistas com os galãs do momento o faziam pensar como seria estar com um deles. Entre uma e outra, claro, se deixava brincar com colegas de classe, amigos da natação ou os próprios vizinhos, curiosos, experimentais, se descobrindo e gozando cada momento. 

Aproveitou seu momento olimpiano. Atleta, campeão, corpo escultural, popular na escola ou onde passava, atraia olhares, sorrisos e galanteios. Exibia em regatas os músculos torneados dos braços, em bermudas as pernas definidas e, quase sempre sem camisa, o desenho dos peitorais trabalhados na água e o abdômen sem dobras. Reto. Liso. Teso. 

Com o coração partido, reencontrou uma amiga de infância, que conhecera quando tinha apenas 5 anos. E assim, teve seu primeiro contato com um mundo heterogêneo. Sem que ela soubesse de suas parcas experiências, o apresentou ao novo mundo, do qual nutria um eterno receio. Mas a música foi mais forte, o ritmo o dominou e, quando menos havia percebido, a pista de dança o tragava. Logo, serviu de ombro amigo para as confissões de sua amiga e, em seguida, usou o dela para se confessar: era gay. 

Dai, a inevitável sucessão de amores, idas e vindas que aqui ainda não cabe descrever. Até que 10 anos depois, por arte do destino, Jeci - grande amigo feito nesse meio tempo - lhe apresenta Vapes. E o que era para ser apenas uma daquelas paixões avassaladoras, se transformou em uma relação. Em uma parceira que, desde 2005, faz parte de sua vida. 

Nesse tempo todo, viveu às escondidas. Seus pais, alimentados pela gama de meninas que os apresentara ainda adolescentes, sonhavam com a tradicional família homem-mulher, com casamento na igreja, lua-de-mel, compra de apartamento, carro, filhos e preocupação com a educação deles. 

Mas ele não estava destinado a seguir esse destino imposto para si. Vapes se tornou seu companheiro. E hoje, 2014, ainda juntos, como todo casal, enfrentam uma montanha-russa de emoções. Aparam arestas, arrumam essa casa louca que é o coração, sempre em dúvidas se estão certos, mas com a certeza de querer uma coisa em comum: estar juntos. 

No meio desse mar de vida, decidiram que era hora de um passo a mais. Numa noite, depois de um papo gostoso e leve como há muito tempo não haviam tido, surge o pedido. Era 02 de Maio. Mais de um mês depois, 07 de Junho, eles trocaram alianças e assim, ficaram noivos. 

O que vem a seguir, é futuro.
Como todo futuro, ainda não está escrito.
Mas está destinado a ser o que quer que seja. 
E que seja o que os dois quiserem.
Porque a Deus pertence
Mas o arbítrio é deles.

8 comentários:

  1. Que barato este depoimento ... sei bem como é vivenciar tudo isto. Afinal, do alto de meus 63 anos de vida, dos quais 39 [setembro 40] com o mesmo e eterno namorado, hoje marido, tenho q ter vivido tudo isto mesmo né?
    Parabéns aos dois e parabéns pela bela e lírica narrativa ...

    Beijão

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    1. Minha nossa. Que delicia Paulo. Me enche de esperanças, saber que nesse mundo colorido e superficial, existem relações duradouras e firmes. Fácil, nunca será. Mas eu também sou de um tempo no qual o diálogo sempre foi o principal em um relacionamento. Parabéns. Me comoveu seu depoimento aqui.

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  2. Fiquei aqui com os olhos brilhando e suspirando...
    Muito amor!

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  3. côusa linda isso!!! e arrematado com o comment do braccini é mesmo "muito amor!!!!!!!!!!!!

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    1. Eu tenho meu ouro, Fred. Mas vcs são minhas pérolas. Tudo que escrevo vem de lá do coração. Beijão.

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    2. Entonces - como eu suspeitava - por aqui é tudo jóia!!! ;)
      E tô rindo até agora com essa aqui: "me deixou igual a pobre hoje de manhã: duro!" ÓOOOTEMMMAAAA!!! Bjs!

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  4. Quando li fiquei louco para comentar, dizer algo, mas o quê ? que achei linda a história, que conheço ou já vivi algo parecido, mas não sabi o que dizer, então entrei aqui nos comentários e encontro amigos, e é apaixonante como teu post o depoimento do meu rei Bratz. Valeu menino que voa.
    ps. Carinho respeito e abraço.

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