quarta-feira, 2 de julho de 2014

Minha Mãe me Tirou do Armário

Estava chegando na academia, um dia, e recebi uma ligação da minha mãe. Bem direta, ela disse que precisava conversar comigo e perguntou se eu teria tempo. 

Daniela Mercury acabara de sair do armário com sua Malu Verçosa. Além da avalanche de revistas, com fotos de troca de aliança, felicidade conjugal, casamento e toda sorte de exposição na mídia, ainda me deparei com artigos e reportagens da bancada evangélica e dos moralistas de plantão, falando sobre a não-naturalidade de um amor homossexual. 

Eu, do lado de cá, aproveitei as mais variadas capas de revistas sobre o assunto e postei mensagens em redes sociais, defendendo meu direito de amar quem eu quisesse, que o meu tipo de amor por outro homem indifere do amor de um homem por uma mulher, que o respeito começa quando as diferenças são aceitas sem questionamentos. Todas as publicações devidamente acompanhadas com a hashtag #simsougay. 

Ao mesmo tempo, a empresa na qual trabalho passou por uma reestruturação e, com ela, tiveram que retroceder uma promoção que eu havia recebido dois anos antes. 

Essa ligação da minha mãe marcou minha vida porque foi o primeiro caso, por mim conhecido, de expulsão do armário. 

Logo depois que eu disse que teria, sim, um tempo, ela já disparou um texto que, sem dúvida, foi ensaiado exaustivamente até aquele momento.  

Ela disse mais ou menos isso: "filho, eu e seu pai estamos aqui e a gente sabe que você" - pausa dramática - "que vc é gay. A gente sabe que vc tem um relacionamento com Vapes e a gente te respeita por isso." - até então, nunca havíamos falado sobre minha sexualidade. "Mas eu acho que essa sua exposição no Facebook está sendo negativa para a sua imagem na empresa. Resolvemos ligar porque achamos que foi por isso que vc perdeu seu cargo e a gente não queria que isso acontecesse". 

Num primeiro momento, tive a certeza que meu coração parou por alguns segundos. Depois, ele voltou mais rápido que uma batucada do Carlinhos Brown ou uma bateria de escola de samba do Rio de Janeiro.  

Expliquei que todos os medos dela, nesse sentido, eram sem fundamento. Até porque, trabalhando com atendimento ao público, a empresa teria preferência por funcionários gays que se preocupam muito mais com requinte, bom gosto é bom atendimento. Aproveitei para afirmar algumas coisas que beiraram a grosseria, mas senti que era necessário.

Disse que era homem e que permaneceria assim. Que não tinha vontade alguma de ser mulher, de me vestir de mulher, usar maquiagem ou usar salto alto. Que o fato de eu ter um homem como companheiro para a vida apenas significava que eu não tinha uma mulher como companheira, mas que tudo o mais era exatamente igual: os problemas, as dificuldades, o companheirismo, a cortesia, o amor.

Achei que foi proveitoso. Agradeci a ela por ter a coragem que eu jamais tive, de me expor para eles. Deixei muito claro o quanto isso me emocionou e me deixou satisfeito e orgulhoso de tê-los como meus pais. 

E foi assim que eu eu fui expulso do meu armário. 

No iPod, Evolution canta meu tema com Vapes: "Walking on Fire". 

12 comentários:

  1. Que bom que tudo ficou bem.Essa coisa de sair do armário é a maior gastura! Tomara que ninguém tenha que passar mais por isso, nos anos vindouros (quando "ser gay" será percebido de maneira tão natural quanto qualquer outra coisa), amém! :-)

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  2. ah, mas eu acho que outros exemplos vão aparecer aqui. Tem sempre um amigo que expulsa, tem gente que expulsa sem querer (sabe, que conta para todo mundo achando que todo mundo já sabia que fulano era gay?), eu, por exemplo, nunca pude estar no armário porque meus pais trancaram ele ainda na infância. Eles já haviam decretado para todos os vizinhos, familiares e conhecidos que eu era gay mesmo antes de eu saber, quando tive consciência de tudo que estava acontecendo era tarde demais para ir para o armário. =)
    por um lado foi bom, eu não tive este sofrimento de sair do armário, por outro lado eu sofri muito preconceito sem saber me proteger, o armário costuma ser útil sobretudo para isso, vc precisa ter armas para sair de lá protegido, vc constrói suas armas atrás das portas dele, eu tive que construir enquanto estava na batalha, não digo que tenha sido mais difícil, até porque foi em doses homeopáticas, ao contrário da saída do armário que vem toda de uma vez né?, mas tb foi difícil. Com certeza foi. Mas também moldou o homem que eu me orgulho de ser hoje, se tivesse sido diferente eu, provavelmente, seria mais um destes viados homofóbicos de Natal.

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  3. parabens pelos pais esclarecidos que tem! que venham novos capítulos! abs

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  4. Muito legal a atitude deles ! Um dia tudo ainda será assim ! Espero !

    Conhecendo por aqui !

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  5. Oi! Ainda não saí do armário para os meus pais ou, pelo menos, ainda não fui expulso dele. Talvez porque moro meio longe e a culpa é sempre sobre a correria da vida de um médico. Desculpa... Rsrs. Mas acho que é sempre um grande alívio quando se tem a certeza que seus pais já sabem sobre você.

    Mudando de assunto, hoje vi seus comentários em meu blog de posts mais antigos! Muito obrigado pelos comentários! Gostei bastante!

    Abraço!

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  6. Mas afinal de contas, você conseguiu perceber se a sua empresa faz essa "verificação" no seu face?

    Eu já trabalhei em empresas que tinham essa preocupação!

    Mas seja como for, desejo coragem, força e siga em frente!

    Abraços

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  7. Amei! Porque o verdadeiro amor é assim: incondicional. E eles souberam que naquele momento havia chegado a hora, ainda que talvez nem vc tivesse essa certeza...rs

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  8. Cumpramos com sabedoria essa missão de educar nossos pais. Acho que até agora nos saimos muito bem! ;-)

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  9. Afinal não poderia ser diferente com duas figuras raras e sensacionais como seus pais ;)

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  10. Poxa que bacana a postura dos teus pais, primeiro de aguardarem teu tempo para contar para eles... e segundo, de não hesitar em interferir quando acharam que algo poderia te prejudicar...

    Quando eu conversei com a minha mãe, uma das primeiras coisas que ela falou era a questão do trabalho, que se preocupava com isso, coisa e tal... Ela também uma vez me chamou a atenção porque eu andava batendo de frente com o povo no facebook.

    De qualquer forma, as vezes é bom ouvi-los... não raro, apesar dos exageros, eles tem alguma razão. Espero que não tenha sido esse o caso do teu emprego...

    Grande abraço.

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  11. Eu acho que eu nunca estive no armário, até quando eu tentei entrar não deixaram. rs

    Achei lindo seu relato, sua história é um exemplo para milhares de outros gays e muito obrigado por compartilhar.

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  12. Bacanérrimo ... eu, por mmim, saí definitivamente e plenamente do armário aos 30 anos e, em momento algum tive qualquer tipo de problemas com família, amigos, trabalho qto a isto ... verdade q isto não é a realidade de todos mas, dia chegará q tudo isto será super natural ... eu acredito.

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